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Digo eu

Digo eu

Encontrar a paz

 

 

 

Estamos a fazer alguns progressos. Devagarinho. Com cuidado. 

Não queremos mais mal-entendidos. 

Chegámos a um ponto onde a paz tem mais valor do muitas outras coisas na vida. É uma necessidade espiritual convenhamos. É tão importante como respirar e sentir o coração bater. Tão ou mais crucial como sermos donos no nosso juízo e sermos capazes de agir em conformidade. 

Não nos podemos dar ao luxo de nos precipitarmos nos julgamentos que fazemos. Não com esta idade madura, depois das experiências que fomos acumulando e nos ensinaram a reagir, medindo os prós e os contras das nossas acções. Temos o dever de pelo menos tentar ser justos. Em relação aos outros e aos seus percursos, assim como ao nosso. 

Talvez encontrando a paz, sejamos capazes de encontrar as respostas para as nossas dúvidas. É lá justamente que iremos poder compreender algumas das razões da nossa conduta, em determinadas fases que atravessámos. Todas elas fazem parte desta nossa vivência de altos e baixos, de períodos em que nos achámos e outros onde nos perdemos. 

O nosso percurso não terminou. Tudo está em aberto. Cabe-nos a nós fazermos o melhor dos dias que ainda nos restam.

Bicho carpinteiro

 

O bicho carpinteiro de faca e queijo na mão, não tem como matar a fome. 

Corre dum lado para o outro, gesticula e atira-se ao ar, mas não vai a lado nenhum de jeito, com o seu jeito de trapalhão.

Derruba árvores e fabrica avenidas que dão num beco sem saída, voltando para trás de cabeça perdida, tudo por culpa da sua agitação. Perde-se à procura duma saída que lhe dê alguma satisfação, voltando ao ponto de partida sem nunca encher as medidas, procurando uma outra solução. 

Não há remédio que lhe sirva. 

Não há paz que lhe chegue. 

Impossível encher-lhe as medidas que se vão alterando a cada segundo, desafiando qualquer perito na confecção dum fato que lhe assente na perfeição. 

Pobre bicho carpinteiro... Sem pouso, sem rumo e sem raízes estabelecidas,  anda sempre numa roda viva em modo de desilusão. Ninguém segura o bicho carpinteiro. 

Ninguém lhe dá uma volta que ele não queira dar.

Não conhece alegria, nada lhe traz prazer. 

Só tem uma razão para o ser... Permanecer nessa busca  até um dia realizar que está enfim a sofrer. 

Então pára e pensa. Pensa pela primeira vez que é tempo de acordar para vida. Deseja apreciar o momento, antes que chegue a inevitável hora de ficar de língua de fora e por fim padecer.

Fases...

 

Há dias em que sinto não ter nada para dar. Outros em que a disposição floresce e dá-se um outro fenómeno bem diferente. Apetece-me sair de casa, ver outra gente e conversar, ainda que os assuntos não sejam profundos nem acrescentem nada de novo à minha sabedoria banal. 

Tenho dito repetidamente que há sempre coisas novas para aprender, o que vem contrariar o que acabo de escrever. A verdade é que o inverno me faz hibernar, deixando as minhas capacidades limitadas ou até mesmo congeladas, não me oferecendo grande espaço de manobra. O mau tempo é contagiante. Ou talvez me queira apenas justificar, dando essa desculpa para o meu comportamento, que não favorece nada nem ninguém. 

Perdi a paciência para todas as formas actuais de comunicar, especialmente as que dão a falsa aparência de que estamos todos perto uns dos outros, quando na realidade estamos cada vez mais afastados. Não quero impingir a ninguém o meu estado de espírito enquanto uso este veículo para transmitir uma felicidade que nem sempre é real. 

Queria escrever frases bonitas e inspiradoras, trazendo algum conforto aos que estão tristes, sem ter que inventar contos de fadas. 

Talvez a solução passasse por recorrer às amizades e tirar partido delas. 

Talvez devesse sair mais de casa.

Talvez haja uma série de outras saídas para esta dormência impertinente, que nenhum príncipe encantado consegue aliviar. 

Não quero que me sintam como alguém que está desesperado. Esta é uma daquelas fases da vida, certamente familiar para muitos. Poderia inventar uma série de desculpas, atribuindo culpas que certamente nem existem. 

Esta sou eu numa altura por que muitos passam. Para alguns é sinal de alarme. Para outros, onde me incluo, é uma forma de dizer que estou consciente do meu estado. Escrever sobre ele, nem que seja por breves palavras, é uma forma de o ultrapassar. 

Não sou poeta

 

 

 

Se um dia eu fosse poeta, poderia escrever frases onde o conteúdo nem sempre faria sentido, mas a harmonia seria sustida. Perfume nas palavras e cores em cada vírgula, viesse ela a propósito ou com função descabida. 

Não conheço melhor forma de escrita do que aquela de ritmo que gira, deixando fluir a caneta, pintando o reflexo da alma, esteja ela por baixo ou em euforia legítima.

Sonhos e desejos, angústias e alegrias reais ou frutos da minha imaginação, seriam flores do campo e ondas de tempestade, suspensas no coração. 

Cantaria para ti o que nunca te disse, dançando com as letras e formando sonetos para te descrever, exibindo sem medo a minha paixão. 

Não nasci para isso. Não tenho nem jeito, nem coragem, nem tempo sequer. Compartilho apenas o pouco que sei, o tanto que sou como outra qualquer. 

Ano novo e a vida continua

 

 

Não dei pela passagem do ano. Sobrevoei o Atlântico dentro dum avião que vinha de São Francisco e aterrei em Londres antes de apanhar mais um que me trouxe até Lisboa. 

A minha primeira reflexão deste ano não comporta frases feitas nem clichés. 

Nada mudou ainda...

Tenho comigo o ano passado e muito dos anos anteriores. Alegrias e tristezas, conquistas e frustrações. Tudo isso me acompanha e faz parte de mim. 

Gostaria de dizer que tenho a certeza que vai tudo mudar para melhor, que o meu empenho vai ser mais perceptível e que estou prestes a atingir o meu auge. Resumindo: não tenho a certeza de nada porque não sou assim tão optimista.

Já ando nisto há uns anos. Perco batalhas e falho nos meus propósitos, porque sou um ser imperfeito, mesmo quando as minhas intenções são as melhores do mundo. 

Não quero atribuir culpas a terceiros nem sequer a mim mesma, porque no decorrer dos dias há sempre imprevistos. Não sei como irei reagir. Não sei se irei agradecer o suficiente para que os outros entendam o quanto estou agradecida. Não sei se irei ter sempre paciência, força e atitudes positivas. Não sei se as minhas acções vão ser sentidas como um apoio, um desamparo ou pura e simplesmente como uma invasão dum espaço onde a minha presença não deveria ser sentida. 

A única certeza que tenho é que quero ser melhor. Em relação aos outros e a mim própria. A dúvida surge no momento em que penso se será isso possível. 

Ano novo e a vida continua.

Natal é família

 

 

 

Eu sei que sou ignorante. Desconheço o conteúdo das mais variadas questões, tanto de ordem política como económica e também geográfica. 

Desconheço muitos dos tópicos que estão na ordem do dia e dos quais muita gente tem uma opinião formada. 

Não sei o nome de muitos ídolos, nem o dos que comparecem nas festas da sociedade. Não frequento restaurantes conhecidos, onde o chef é bem capaz de vir à mesa meter dois dedos de conversa por simpatia ou mera conveniência, sei lá. 

No entanto sei de outras coisas que são importantes. 

Fui bem educada e comporto-me como tal (palavrões à margem). 

Consigo ver a diferença entre uma pessoa bem intencionada e outra cujo comportamento traz sempre água no bico. 

Aprecio com a maior intensidade o sentido de humor e o som das gargalhadas. 

Prezo pessoas de carácter, mesmo as que têm mau feitio.  

Respeito a vontade dos outros e as escolhas que fazem.

Dou a maior importância aos valores que me foram incutidos e reconheço que são a base para uma convivência saudável. 

Tenho bem presente a importância da família em tudo o que faço na vida. 

Gostava que o Natal continuasse a ser vivido com o espírito de união, onde quem precisa de ajuda fosse naturalmente ajudado, independentemente das circunstâncias. Que as portas se mantenham abertas à partilha do amor e à gratidão. 

 

Linha

 

 

Não conheço a distância que me separa dum abismo. Se no caminho que percorro existe apenas uma linha ténue e quase imperceptível entre uma vivência saudável e outra carente de sentido. 

Ainda sei o que me passa pela cabeça face às vicissitudes da vida, sendo capaz de reagir, mesmo quando não encontro a melhor solução.  

O que acontece afinal para se dar o tão fatídico desequilíbrio, com consequências dramáticas em relação à própria maneira de ver e estar na vida, é realmente o que mais me intriga.  

Deve haver tanto razões físicas quanto psíquicas para que se dê uma total impotência face às reflexões e conflitos, desencadeando emoções desproporcionadas face à impotência de resolver algumas questões pessoais. 

Hesitações e dúvidas todos as temos. Mas para quem transpõe essa linha quase imperceptível, passa apenas a ver portas fechadas e uma total escuridão num labirinto intransponível.  

Não será apenas por insegurança, mas talvez por se dar um enorme conflito entre vários factores interiores e exteriores, com  consequências catastróficas para quem se deixa atrair por um precipício. 

Sei de quem já lá esteve e como é tão difícil ou mesmo impossível voltar ao normal. 

Esta é uma das questões em que mais penso e onde o chão mais me foge.

Nunca te deixarei

 

 

 

Quando o dia chegar em que já não me poderes ver, lembra-te de mim com saudade por tudo o que fui mas também pelo que não pude ser. 

Lembra-te de mim totalmente, não tentando fazer de mim uma santa, mas antes pela mulher que te viu crescer. 

Perdoa as minhas falhas e aproveita para recordar o bem que chegou até ti através das minhas mãos, do meu olhar e dos meus concelhos, da minha entrega sincera enquanto mãe.

Sei que nem sempre me soubeste ler. Que às vezes me vias como uma mulher que te contrariava, te moía o juízo e com quem tentaste medir forças à custa duma pressão difícil de suster.

Uma mãe não nasce ensinada. É à medida em que os filhos vão crescendo que se aprende a educa-los, a dar-lhes o que precisam e a saber recusar algumas exigências que  só os filhos sabem fazer, tocando no ponto fraco de cada mãe. 

Uma mãe tem que ser forte, ainda que seja fraca. 

Tem que ser amável, mesmo quando não há razões para o ser. 

Tem que ser prestável, ainda que esteja esgotada. 

Uma mãe tem que tudo compreender em relação a cada um dos filhos, sejam eles dóceis ou rebeldes ao ponto de a fazer enlouquecer.  

Uma mãe põe-se no lugar dos filhos para que seja possível tudo resolver. As brigas e as revoltas, a falta de paciência, o nariz empinado e as respostas tortas, os desgostos, as euforias, as neuras, as mentiras  e as desobediências. 

Num instante tudo passa e os filhos saem de casa. As preocupações que podiam desaparecer, apenas se transformam. 

Quero que saibas que sempre estiveste em primeiro lugar, mesmo quando desacertadamente pensaste estar em último. Que o meu amor por ti foi sempre o maior de todos os amores que algum dia tiveste. 

E quando chegar o dia em que já não me puderes ver, quero que saibas que nunca te deixarei. Basta que me sintas cada vez que o teu coração bater. 

Summer (cars)

 

 

 

Quando acaba o verão e entra o outono de dias surpreendentemente amenos, instala-se dentro de mim uma paz quente e tranquilizante. 

Chega a chuva fria e impiedosa para me destabilizar, tal como o céu carregado e escuro, levando-me a esperança dum futuro melhor.  Dias inteiros sem sol com a água a cair das nuvens duma forma brutal, faz-me lembrar o fim do mundo. 

O meu corpo retrai-se como que para se proteger duma tamanha tragédia, não me deixando espaço para respirar fundo e logo devolver-me a calma indispensável ao meu bem-estar. 

Entro no carro ensopada até aos ossos e ponho a música a bombar. Prefiro uma boa batida a uma balada bonita. Sempre fui assim. As melodias que fizeram parte da minha adolescência, restituem-me muito do necessário para que eu pense que vale a pena continuar presente, mesmo nestes dias tristes de chuva incessante e opressiva.

Não controlo o desejo de cantar as letras que sei de cor, esquecendo as rugas, os cabelos brancos e a frescura dos 17 anos "long gone"!

"Summer, it turns me upside down, 

summer, summer, summer, it's like a merry go round!

Canto até a entrada do baixo, instrumento de ritmo essencial, que me dá a luz verde para começar a balançar. Viro outra. Começo a sentir o calor, o entusiasmo e a necessidade de me manifestar. Abro a janela, independentemente da chuva que entra e do vento que me bagunça a farta cabeleira (que de farta tem muito pouco) para cantar, indiferente aos olhares que vêm dos carros que passam por mim. 

São umas atrás das outras as músicas que tocam em mim e me acordam para a vida. 

"Make a deal and make it straigt

All signed and sealed, I'll take it!

Vou tranquila (65 KM/H) deixando-me absorver pelas memórias e por tudo o que de belo a vida me dá. A Música é indiscutivelmente uma delas. 

 

É cada vez mais difícil

 

 

 

É cada vez mais difícil estar aqui. Não tenho nada a dizer sobre mim que tu já não saibas, mesmo que seja idealizado por ti. Então tudo passa a fazer parte duma meia verdade e não tenho como me defender da fantasia, mesmo que ela não me faça justiça. 

Tenho que dar a mão à palmatória, reconhecendo que podes até ter razão. 

Porque afinal de contas eu retraio-me, escondo-me e calo-me em vez de mostrar o que tenho dentro de mim. 

Comecei por ser segura, depois virei assustada, tímida e bloqueada, tendo que fingir ser fortaleza, para me proteger do sofrimento que tudo me causava. Não imaginava que um dia o pudesse parecer por fim. Um papel tão convictamente representado, que eu própria me convenço se não serei assim. 

Fecho os olhos, lembrando-me da minha mãe que parecia também ela impenetrável, sem tempo ou lugar para cair. Quanta responsabilidade e quanta preocupação, sem chance para vacilar ou verter uma lágrima, guardando a tristeza dentro de si. 

Não sei onde foi parar o meu espaço que em nada se assemelha ao dela. Razões  para chorar não me faltam mas o hábito foi-se perdendo, nesse espaço desencontrado de mim. Então, em vez de chorar, contenho-me. Em vez de gritar, calo-me. Pareço por isso imperturbável, ou talvez mesmo insensível. Tão ou mais intransponível como a muralha da china que atingiu o seu pico na dinastia de Ming.

Pergunto-me muitas vezes se o papel que represento faz parte duma peça de teatro, se é da minha responsabilidade ou se foi um modo de sobrevivência que me tornou imperfeita do princípio até ao fim.