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Digo eu

Digo eu

Sobrevivo à ansiedade

 

 

 

 

Sobrevivo à ansiedade

 

 

Eu não sei porque sou assim. Não sei porque é que desde pequena vivo em permanente ansiedade. Mas desde que me conheço como gente que me lembro de ter sido sempre assim, embora não tivesse a consciência (o que é a consciência para uma criança) desse handicap (não encontro outro nome para isto). 

Comia uma azeitona e o raio do caroço tinha que ficar preso na garganta só para me estragular. Levantava-me da mesa a correr, aflita e com falta de ar, quando o caroço já tinha ido parar ao estomago. Punha a minha mão pequena contra o peito para sentir o bater do coração e quando não o sentia, corria pela casa inteira só para ter a certeza que ele voltava a bater e que eu o voltava a sentir. 

Eu não sei que raio de coisa é esta nem quais são as razões. Sempre tive o pânico da morte, da minha e da dos outros. Vivia angustiada com o que poderia acontecer aos meus pais, com o me me iria acontecer a mim se eles morressem de repente, sem dizer que tinham que partir. E se dissessem, pior ainda! Por isso tantas vezes acordava a meio da noite e seguia o caminho que me levava à cama da minha mãe, só para a ouvir respirar. 

Ali ficava eu até o sono pegar, mais tranquila por cheirar e sentir a presença da minha mãe. 

E sempre foi assim. As idas para o colégio eram um sacrifício, desde que se lembraram de me pôr no liceu francês. Eu que andava tão contente no mesmo colégio do meu irmão Gonçalo, tinham que vir abanar o meu sossego e dar cabo da minha confiança. Tenho tão presente a imagem do primeiro dia no liceu, com a minha mãe a tratar da papelada e eu sentada num banco com as lágrimas a correm-me pela cara abaixo, que não me sai da cabeça a pergunta que nunca cheguei a fazer: Porquê essa decisão?  Se foi para me prejudicar? Claro que não. Mas para uma criança de 4 anos é difícil de perceber a vantagem de andar num colégio estrangeiro e aprender a falar francês. 

Isso agravou toda a minha ansiedade. Tinha que me levantar às 6 da manhã, ir para Lisboa e regressar às 8 da noite, hora em que o mau pai regerssava do trabalho para casa. Uns meses depois, tive o meu primeiro break down à séria. Deixei de comer e de dormir. Segundo o médico que me analisou, eu estava com um esgotamento. 

Dormir fora de casa era um tormento. Não ver os meus irmãos ao fim de semana, porque tinham ficado de castigo no colégio interno, deixava-me num estado de nervos inacreditável. 

E sempre foi assim. 

Talvez porque eu não fosse de dizer o que me preocupava. Talvez porque não houvesse tempo para dar atenção aos que não se manifestavam aos gritos mas que choravam às escondidas sem dizer nada a ninguém. Talvez porque não houvesse o costume de se perguntar aos filhos o que queriam ou deixavam de querer. 

E logo eu que fui mimada por todos lá em casa. Então porquê essa ansiedade? Porquê o pânico? Porquê a angustia? 

Talvez porque a atenção fosse virada para um lado em vez de ser focada noutro onde era mais peciso. 

E toda a minha vida tem sido assim. Um simples toque dum telefone fora de horas, deixa-me arrepiada. É por ser pessimista? É por ser preocupada? É o quê afinal? 

Eu não sei o que é concretamente. Talvez algum especialista me venha dizer aquilo que, lá no fundo sempre soube ou talvez haja outras razões que precisavam de ser aprofundadas. O histórico da família, o facto de sermos muitos irmãos, o desiquilibrio afectivo e emocional. 

Mas cá estou eu sã e salva, tentando dar o meu melhor. Às vezes sinto que resulta, outras não.