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Digo eu

Digo eu

Família em 2 tons

Esta é a minha família. Dentro dela existem duas gerações bem distintas, apesar de só estar a falar de nós, os irmãos. Há os mais velhos e os mais novos. Os mais velhos tiveram uma educação talvez mais rígida mas também tiveram mais privilégios, já que houve a possibilidade na altura de lhes proporcionar uma educação à séria em bons estabelecimentos de ensino, chefiados por padres católicos (claro). Depois do colégio veio a universidade, donde saíram 2 belíssimos engenheiros e 2 belíssimos doutores de economia e finanças. A vida estava garantida, havia emprego e um salário de acordo com as habilitações de cada um. 

As raparigas era mais outra onda. Depois de acabarem o liceu, não seguiram mais nenhuns estudos, apesar da insistência da minha mãe, uma mulher de visão, que sempre insistiu que uma mulher devia ser tão instruída e independente quanto qualquer homem. Mas toda essa geração de mulheres estava mais virada para casar e ter filhos e criar uma família sustentada pelo marido. Todas elas tiveram a sorte de comprar o enxoval entre Paris e Londres, as 2 capitais mais extraordinárias de toda a Europa. Tiveram tudo do bom e do melhor, o que não impediu, a dada altura,  que muitos dos casamentos tivessem ido por água abaixo. Não sei se lhe chame sorte ou azar ao destino que lhes caiu nas mãos

A nossa casa era um espectáculo. Tudo primorosamente bem organizado, graças à força extraordinária da minha mãe e às suas capacidades metódicas e à forma de gerir tudo e todos, sem excessos ou fantasias mas com tudo o que era preciso. Nunca nada nos faltou. Graças também ao meu pai, ao seu trabalho e empenho, ao seu salário mais do que justo que permitiu gerar e sustentar toda esta “empresa difícil”. 

Os mais novos apanharam outro estilo de vida com menos regalias que os mais velhos. Levámos com todas as transformações pós revolução, uma série de cambalhotas e pontapés, juntamente com a confusão. No meio dela tornou-se difícil ter acesso a uma boa educação e a uma vida minimamente estável. Ninguém sabia o que o futuro nos reservava, sobretudo em termos académicos. Estava tudo virado de pernas para o ar, faziam-se greves às aulas, espancavam-se professores. 

O meu pai tinha chegado à altura da reforma e apesar dos cargos que ocupou de grande responsabilidade, teve direito a receber por mês, a mesma quantia que um continuo da mesma empresa. Foi tudo nivelado por baixo e não de acordo com os direitos que seriam justos. 

Os mais novos tiveram que se fazer à vida, lutando por um lugar ao sol. Os cursos foram totalmente diferentes bem como os empregos que se seguiram aos estudos. Não havia garantias de nada. Foi tudo à laia de meia bola e força como quem é obrigado a engolir um papo seco e agradecer de o ter conseguido agarrar. Andando de um lado para o outro,  fomos construindo as nossas vidas sem as bases sólidas que tiveram os mais velhos. 

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