Larga a corda bamba
Não conheço ninguém que não goste de rir. Nós somos peritos nessa matéria, mesmo com as coisas mais simples. Arranjamos sempre maneira de ter garça, falando daquela maneira que só nós sabemos falar. Mas de vez em quando também é preciso falar a sério.
Quero saber imensas coisas sobre a tua vida mas acima de tudo, interessa-me saber o que sentes e como olhas para o mundo. Já deves ter percebido que se ganha experiência ao longo da vida, assim como se ganha uma noção mais real de como somos e como são os outros, o que queremos fazer e o que não queremos de todo, quem são as pessoas que nos interessam e quem são as que pomos de lado, por não terem rigorosamente nada a ver connosco, mesmo que, a dada altura, já não nos tenhamos identificado com A, B ou C e que agora já nem fazem parte no nosso alfabeto.
É uma pena termos que perder outras tantas como a espontaneidade e a inocência que gostaríamos de manter, para que fosse sempre possível conservar a simplicidade de uma criança, tantas vezes inconveniente por ser transparente como água. Essa mesma inconveniência na fase adulta pode ser insuportável. Passamos a ter obrigação de medir o que vamos dizer a quem, tendo em conta a sensibilidade de cada um.
Os anos passam e nós vamos sofrendo alguns golpes, enquanto tomamos consciência de que nem todos são o que julgávamos, nem todos são como gostaríamos que fossem, nem todos retribuem na mesma moeda o que lhes fomos proporcionando, como por exemplo o nosso tempo e a nossa paciência que às tantas também se esgota.
Não é nada fácil entrar no mundo dos adultos e depararmo-nos com a porcaria toda que para lá anda. As manhas, as mentiras, a falsidade. É preciso uma grande dose de estaleca para superar todos esses murros que nos abanam por fora e por dentro, como se entrássemos num ringue, onde à partida sabemos que vamos levar porrada. Isso é uma daquelas coisas da vida que não podemos evitar. Não são as feridas que doem mas os sentimentos que provocam. Raiva, indiferença e uma necessidade estúpida de vingança que nos transforma e nos irrita ao ponto de perdermos a cabeça e até mesmo a razão, acredita.
Não penses que sou uma santa, daquelas que se cala e que dá a outra face como Jesus Cristo. Já tive ascos atómicos por muita gente e uma vontade incontrolável de as desfazer ao pontapé ou de as insultar de cima abaixo. Já tive os meus acessos de fúria, os meus momentos de tristeza, os meus ataques de nervos, daqueles em a sensação é de total impotência. Mas com o tempo também se aprende a puxar as rédeas para parar. Em vez de entrarmos em conflito com A, B ou C, o melhor é ignora-los ou pura e simplesmente deixa-los ser o que são, sem que isso nos afecte e nos transtorne. Deixa-te de equilíbrios na corda bamba. Foca-te naquilo que interessa e aprende que há muita coisa na vida que não se pode mudar. Adapta-te às circunstâncias e aproveita tudo o que há para aproveitar, nunca esquecendo que o riso e o choro fazem bem à saúde e à alma.