Saber-te como sempre
Aqui me tens atenta como sempre. Sento-me e escrevo a pensar em ti, para tentar que as minhas palavras te animem e te abram o coração. Às vezes perdemos a oportunidade de conversar, como se não houvesse nada para contar sobre nós, logo nós que temos tanto para dizer e voltar a dizer, quantas vezes forem precisas até assimilar. Penso em ti mais uma vez, com tanto que me orgulho da tua vida e me apoquenta saber desse teu lado que cisma e se sente só. Desvias o olhar e calas o que te agita, deixando que essa imagem silenciosa retire de mim o orgulho e me encha de preocupação.
Melhor do que ninguém sei o que sentes, acredita.
Talvez por também já ter passado por esse turbilhão de perguntas que se vão amontoando e confundindo a procura por respostas conclusivas.
Talvez por também não ter sabido o que queria da vida.
Talvez porque a felicidade que nos chega dum lado, não chega para nos sentirmos satisfeitas com a vida.
Talvez não exista exactamente o que procuras.
Ou talvez exista algo semelhante que ainda não encontraste.
Talvez não acredites que seja possível ser-se feliz com esse amontoar de descrenças e hesitações que te fazem ver o mundo cinzento e sem esperança.
Perguntaste-te porque é que há-de haver sempre alguma questão, coisas para esclarecer e tristezas que te batem à porta todos os dias, sem que consigas achar uma solução onde passes a olhar para o mundo, admirando todas as tonalidades.
De repente, aquilo em que sempre acreditaste, virou um absurdo. Deus, por exemplo, parece que virou um fardo em vez dum porto de abrigo, onde encontravas o conforto que mais ninguém te podia dar. Deixou de fazer sentido ter fé, como deixou de fazer sentido embebedares-te e acordares na manhã seguinte de ressaca.
Saber-se que não se sabe tudo é, apesar de tudo, um processo que se vai interiorizando até chegar à conclusão que é saudável e positivo. Que há sempre novas perguntas para fazer, coisas novas para aprender, dúvidas que surgem de todo o lado, certezas que mudam dum dia para o outro e nos fazem pensar.
Apoquenta-me saber desse teu lado inquieto e só, visível em toda a tua postura. Na forma como respiras, no olhar que desvias e no desabado que não sai. É esse silêncio que me preocupa. Preocupa-me a gargalhada que não dás. Preocupa-me saber-te carente de amizades que se foram e que sintas que não as podes encontrar noutro lugar.
Não vejas em cada esquina uma ameaça, em cada pessoa que encontras um inimigo, em quem não podes confiar. Não vejas Deus como um personagem inatingível e surreal, ou uma coisa que te impingiram quando te educaram. Ter crises de fé é normal. Duvidar, questionar e procurar outros caminhos é normal.
Pouco a pouco, o amadurecimento vai-nos ensinando muito sobre nós. Vamos aprendendo. Vamos construindo o nosso mundo com aquilo que vamos alcançando, passo a passo, devagar. Não é depressa que tudo acontece. Não é da noite para o dia. É na medida do possível, com esforço, com tristezas e alegrias que vamos sabendo valorizar. E um dia olhamos para a vida duma maneira que nos orgulha e nos satisfaz.